Quando falta ácido fólico nós temos um prejuízo na divisão celular e na síntese proteica. Sua deficiência durante a gestação aumenta os riscos de defeitos no tubo neural.
Isso tu já deves saber. Mas tu sabias que o consumo adequado de folato (somando a dieta com a suplementação) tem muitas outras funções – especialmente nos 3 meses que antecedem a gestação?
As recomendações da OMS para a população em geral recomenda o seguinte:
Pré-concepção (4 à 12 semanas antes de engravidar): dieta saudável e com adequado de teor de ácido fólico (ou seja, contendo 400mcg de folato na dieta)+ suplementação de ácido fólico (400mcg/dia)
Primeiro trimestre gestacional (até 12 semanas gestacionais): dieta saudável e com adequado de teor de ácido fólico (ou seja, contendo 600mcg de folato na dieta)+ suplementação de ácido fólico (400mcg/dia)
E conseguimos chegar facilmente nessa quantidade de 400-600mcg/dia de folato via dieta? Sim, facilmente conseguimos. Exemplo:
* Lentilha cozida (1 concha grande): 165mcg
* Espinafre refogado (4 colheres de sopa): 107mcg
* Abacate (5 colheres de sopa): 61mcg
* Laranja bahia (1 unidade grande): 47mcg
* Beterraba cozida (1 unidade média): 90mcg
* Brócolis no vapor (2 xícaras): 156mcg
= 626mcg/dia de ácido fólico com estes alimentos
⭕️Mas claro, nem tudo acontece de forma tão linear: não basta ingerir o folato, precisamos metabolizá-lo e absorvê-lo. A biodisponibilidade dos folatos naturais é dependente de vários fatores, tais como a desconjugação intestinal dos poliglutamatos, a instabilidade de certos folatos lábeis e a presença de certos componentes no alimento que podem aumentar a estabilidade do folato natural durante a digestão. Os folatos são predominantemente poliglutamatos e necessitam ser hidrolisados para monoglutamatos para serem absorvidos no intestino delgado. Este processo ocorre num pH ótimo entre 6-7, portanto alimentos que alteram o pH intestinal podem acarretar uma incompleta desconjugação do poliglutamato, e conseqüentemente, uma diminuição na biodisponibilidade desta vitamina. E o que altera o pH intestinal? Excesso de bactérias patogênicas habitando aquela região. E isso acontece quando ingerimos excesso de conservantes, corantes, açúcar, uso diário de adoçantes artificiais, excesso de carne bovina (que aumentam cadaverina e putrecina), alimentos que para nós é fermentável, uso frequente de antibióticos, uso frequente de inibidores de bomba de próton (os famosos prazóis), stress excessivo… tantos fatores! Ou seja, para aproveitarmos o que uma dieta rica em folato nos oferece, precisamos estar saudáveis. Uma ótima semente num solo pobre não rende boa colheita.
E qual a importância do folato no período pré-concepção?
Ao longo da gestação, especialmente se há deficiência de vitamina B12 e reposição suplementar da mesma, é importante que se inclua todo o complexo B – não apenas a B12. Afinal, não se chamaria complexo B se uma vitamina deste complexo não interferisse na biodisponibilidade e metabolismo da outra. Neste caso, o folato, sendo vitamina do complexo B, é mantido nesta reposição suplementar. O excesso de reposição de vitamina B12, ao longo de alguns meses, pode diminuir o níveis de vitamina B12 – e vice versa. Em termos de complexo B e minerais, nada se suplementa de forma isolada.
Em dois estudos observacionais (um de 2016 publicado na British J. of Nutrition e outro de 2017 publicado na J. pediatric) com mais de 200 mil mulheres relatam que o uso na pré-concepção diminuiu o risco de parto prematuro, de bebês pequenos para a idade gestacional (PIG) e de baixo peso ao nascer.
Outro estudo, publicado em abril de 2019 na Diabetes Care, demonstrou que o uso na pré-concepção diminui risco de diabetes gestacional.
Atua na metilação gênica e programação metabólica: quando temos uma região promotora de um gene METILADA, o fator de transcrição não consegue “acessar” o DNA. Quando eu metilo o DNA eu “desligo” o gene. Pequenas falhas no estabelecimento ou manutenção desses processos podem desencadear o desenvolvimento de patologias, como a encontrada em síndromes genéticas e no câncer. Epigenética é um assunto longo, mas de forma bem resumida é isso.
➡️Quem faz esse desligamento do gene é a SAMe, um grande doador metil produzido a partir do Metabolismo Metil – e quem remetila a homocisteína é o metilfolato (B9), a B12, a B6, a colina e o zinco – olha aí a importância de não suplementarmos o folato de forma isolada – tampouco em altas doses como a de 5mg/dia. Altas doses de ácido fólico para a mãe podem estar associadas ao aumento do risco de asma infantil, por exemplo (OR de 3,16, ou seja, não é pouco), ainda que caibam mais publicações futuras para elucidar esta questão.
A reposição de folato na forma de ácido fólico necessita da atuação de uma enzima – e essas enzimas, quando em bom funcionamento e sem polimorfismos genéticos, consegue atuar sobre doses de 400mcg/dia ou menores de ácido fólico, mas não em doses maiores. Ou seja, doses de folato na forma de ácido fólico devem ser evitadas em doses elevadas (como de 2mg ou mais), especialmente se de forma isolada. Isso pode aumentar a quantidade de ácido fólico não-metabolizado. Mas resolve ofertar metilfolato ao invés de ácido fólico, sem as outras vitaminas do complexo B? Não. Exemplo disso é a formação de hemáceas (olha o tratamento de anemia com mega doses de ácido fólico e sem B12 monitorada), precisamos de tetra-hidro-folato e não de metilfolato – e sem a B12 essa conversão é prejudicada, fazendo deficiência inclusive de SAMe – e olha nossa metilação gênica tão importante no período pré gestacional e gestacional. Complexo B sempre, ajustado de acordo com cada gestante.
Se és gestante ou tentante, converse sobre isso com teu nutricionista e/ou obstetra.
Outros artigos:
1. Maternal folate exposure in pregnancy and childhood asthma and allergy: a systematic review – 2013.
2. Folate and vitamin B12 levels in early pregnancy and maternal obesity – 2018
3. Maternal folate levels during pregnancy and children’s neuropsychological development at 2 years of age – 2020
4. Nutritional role of folate – 2017